A Música Trovadoresca em Portugal

Contextualização:
  • Na Idade Média, surge e floresce, como expressão musical profana, a música trovadoresca.
  • Existe alguma controvérsia em relação à origem do movimento, existindo várias teses sobre o assunto, mas nas origens da arte trovadoresca galego-portuguesa está a arte dos trovadores provençais.
  • Este movimento nasce no sul de França no início do séc. XII, e rapidamente alastra-se pela Europa através dos guerreiros que partiam para as cruzadas, e dos trovadores e jograis que visitavam as cortes.
  • Primeiramente, a arte de trovar foi apenas cultivada pelos nobres, mas mais tarde, a arte estendeu-se à burguesia.
  • Os trovadores provençais definiram os modelos e padrões artísticos, através da arte da canso e do fin’amor, e compondo e cantando já em língua falada (occitânico). 
  • A arte trovadoresca galego-portuguesa, adoptando naturalmente os modelos occitânicos, assume um carácter muito próprio
  • Esse carácter próprio foi desde logo assinalado pela criação de um género próprio, as cantigas de amigo. 
  • Estima-se que tenha chegado até nós cerca de 1680 poemas profanos ou de corte, e da autoria de cerca de 187 trovadores e jograis.
Origem:
  • Admite-se que a iniciativa deste movimento poético-musical tenha vindo do sul de França, da Provença
  • Estes trovadores eram denominados de troubadours, e produziam em língua d’oc (que deu origem à língua espanhola). 
  • No norte de França chamavam-se trouvères, e produziam em língua d’oil, que mais tarde se originou a língua francesa. 
  • Os trovadores alemães chamam-se Minnesaenger e interpretavam composições, que para além de cuidadas, eram longas e não apenas simples canções populares.
Língua:

  • O Galego-Português era uma língua falada na faixa ocidental da Península Ibérica até meados do séc. XIV.
  • Derivado do latim, era uma língua distinta antes do séc. IX quando surgiu no noroeste peninsular. Portanto, mais do que uma língua, a expressão galego-português designa uma fase dessa evolução, que posteriormente conduzirá à diferenciação do Galego e Português actuais.
  • A época por excelência do Galego-Português é entre os séculos X e XIV, mas no entanto a partir do final do século XII, a língua falada afirma-se e desenvolve-se como língua literária por excelência.

“Tal extensão de sentido justifica-se pela uniformidade da língua desde o extremo da Galiza até ao extremo do Algarve, apenas com algumas variantes provinciais, dentro de um tipo comum; e também pela grande semelhança de modos de viver, sentir, pensar, poetar – uniformidade e semelhança que falam eloquentemente a favor da afinidade primitiva de lusitanos e galaicos”

Comentário de Carolina Michaëlis de Vasconcelos ao sentido alargado que se dá ao termo galego-português

Trovadores:

  • Os trovadores contribuíram e muito para o desenvolvimento da arte musical, porque para além de divulgadores dos costumes e das práticas musicais pelas viagens, promoveram os movimentos musicais e o uso frequente de alterações cromáticas contribuiu para o aparecimento das escalas modernas. 
  • Dentro da lírica trovadoresca galego-portuguesa é preciso destacar alguns nomes, entre eles:

D. Afonso X:

¯ Para além de ter sido um grande mecenas deste movimento, foi um dos maiores poetas e trovadores da lírica galego-portuguesa.
¯ Chegaram até nós 44 poemas da sua autoria, entre elas cantigas de amor, mas principalmente cantigas de escárnio e maldizer.
¯No entanto a sua obra mais conhecida é a compilação das Cantigas de Santa Maria – um vasto conjunto de 420 poemas religiosos, de louvor à Virgem e de narração dos seus milagres.
¯As Cantigas de Santa Maria, pertencem a uma tradição cultural bem distinta , pois têm em comum com as cantigas profanas a língua e eventualmente espaços de produção semelhantes.
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D. Dinis:
¯Neto de Afonso X, destacou-se como trovador, porque não só apreciava literatura, como foi ele próprio um poeta notável e um dos maiores e mais fecundos trovadores do seu tempo.
¯Aos nossos dias chegaram 137 poemas da sua autoria, (73 cantigas de amor, 51 cantigas de Amigo e 10 cantigas de escárnio e maldizer).
¯Estas cantigas pertenciam a um cancioneiro perdido do qual sobra somente um fragmento com notação musical, o Pergaminho de Sharrer, localizado na Torre do Tombo em 1990. 

Martim Codax:
¯Os dados biográficos são pouco conhecidos, mas julga-se que a sua origem nos remete para o sul da Galiza, mais propriamente Vigo e que seria jogral de profissão.
¯Terá vivido numa época indeterminada dentro do período que compreende a segunda metade do séc. XIII e provavelmente o início do séc. XIV.
¯As suas composições são consideradas das mais importantes da lírica galego-portuguesa, que graças ao pergaminho de Vindel, conservamos a melodia de seis das sete cantigas de amigo.
Cantigas/Géneros:
  • As canções trovadorescas podiam ser de várias espécies, podendo ser canções pessoais ou apenas narrativas. 
  • Quando se fala de canções pessoais, temos: 
Canção amorosa
Canção política
¯Planh (lamento)
¯Tenso
¯Canção das cruzadas
¯Jogo partido 
  • Tratando-se de canções narrativas podemos encontrar: 
¯Alba
¯Chanson de toile
¯Pastourelle
¯Baladas, rondós, estompie  


Os principais géneros da poesia galego-portuguesa são:
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  • Cantiga de amor
¯Género de carácter mais aristocrático, segue o universo do fin’amor provençal.
¯Define novos moldes sociais e culturais, as relações entre o homem e a mulher, ou entre o poeta servidor e a sua senhora (o chamado “amor cortês”).
¯Apresenta-se com uma voz masculina sentimental, cantando a beleza e as qualidades de uma senhora inatingível e imaterial e o sofrimento do poeta face à sua indiferença ou até à sua incapacidade de lhe expressar o seu amor.
¯Apesar de influenciada pelo canso provençal, a cantiga de amor galego-portuguesa assume características distintas, nomeadamente o facto de ser mais curta e de frequentemente incluir um refrão.  


  • Cantiga de amigo 
¯Tem um registo mais popular ou burguês e é um género autóctone, porque as suas origens remontam a uma vasta e arcaica tradição na voz feminina, tradição essa que foi seguida pelos trovadores e jograis galego-portugueses mas adaptada ao universo cortês e palaciano.
¯Compostas e geralmente cantadas por um homem, estas cantigas põem em cena um universo feminino alargado, remetendo-nos para um universo definido quase sempre pelo corpo erotizado da mulher.
¯Estas cantigas recorrem a uma técnica de construção estrófica um pouco arcaica denominada de pararelismo, que consiste em repetir a mesma ideia em versos alternados.

  • Cantigas de escárnio e maldizer 
¯Estas cantigas representam mais de um quarto do total das cantigas que chegaram até nós.
¯Podem ser definidas como as cantigas que os trovadores faziam quando queriam “dizer mal” de alguém, têm por isso um carácter mais satírico.
¯Enquanto que nas cantigas de maldizer, a crítica seria mais directa e ostensiva, nas cantigas de escárnio, a crítica era feita de forma mais subtil.
¯Na esmagadora maioria dos casos tratava-se de uma sátira mais personalizada, dirigida a uma pessoa em concreto, surgindo logo nos primeiros versos da composição.
¯Estas cantigas satíricas abarcam um vasto leque de motivos, personagens e acontecimentos.

Manuscritos

¯Conhecemos as cantigas profanas galego-portuguesas através dos seguintes manuscritos.
¯Cancioneiro da Ajuda
¯É o mais antigo cancioneiro, datado do início do séc. XIV, e o único que será comtemporâneo da última geração de trovadores.
¯É no entanto, o mais incompleto, contendo apenas 310 composições, na sua esmagadora maioria de um só género, a cantiga de amor.
¯Foi descoberto na biblioteca do Colégio dos Nobres no início do séc. XIX e hoje está guardado na Biblioteca do Palácio da Ajuda, em Lisboa.
¯O Cancioneiro da Biblioteca Nacional e o Cancioneiro da Vaticana são manuscritos copiados em Itália, nas primeiras décadas do séc. XVI, sob ordens do humanista Angelo Colocci, a partir de um cancioneiro anterior, hoje desaparecido.

Exemplos musicais:

Afonso X:

http://cantigas.fcsh.unl.pt/versaomusical.asp?cdcant=485&cdvm=347

D. Dinis:

http://cantigas.fcsh.unl.pt/versaomusical.asp?cdcant=592&cdvm=98

http://cantigas.fcsh.unl.pt/versoesmusicais.asp?cdcant=529&vm1=127&vm2=231

Martim Codax:

http://cantigas.fcsh.unl.pt/versoesmusicais.asp?cdcant=1308&vm1=38&vm2=45&vm4=114&vm5=236&vm6=287&vm7=305&vm8=322&vm9=346&vm10=373&vm12=398 http://cantigas.fcsh.unl.pt/versoesmusicais.asp?cdcant=1311&vm1=48&vm2=117&vm3=239&vm5=291&vm6=308&vm7=325&vm8=377&vm9=401&vm10=416

Trabalho elaborado por: Cátia Santos